Biscoitos que se declaram integrais e contém apenas farinha de trigo branca, cereal integral que não tem alto teor de fibras, pães com rótulo de integrais e que contém traços de trigo integral. Como fica o consumidor?

Imagem: Getty
A importância dos cereais integrais
A Organização Mundial da Saúde (OMS) recomenda que o consumo de cereais integrais seja parte da estratégia de diminuição das mortes por diabetes, problemas cardiovasculares e câncer. O Guia Alimentar da População Brasileira, publicação do Ministério da Saúde, indica que devem ser consumidas diariamente frutas, verduras e legumes, além de cereais integrais. Eles contém minerais, vitaminas, ácidos graxos e fibras preservados, que precisam ser responsáveis por mais da metade da energia diária fornecida pela alimentação.
A legislação que deverá regulamentar a denominação “integrais”
A Comissão de Desenvolvimento Econômico, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados aprovou, em fevereiro de 2018, a proposta que exige que os órgãos do governo federal, como a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) estabeleçam a delimitação da porcentagem de componentes integrais nos alimentos.
De acordo com a proposta aprovada, a Anvisa terá um prazo de 120 dias, após a entrada em vigor da nova lei, para estabelecer os percentuais obrigatórios na composição dos alimentos rotulados como “integral, “semi-integral” ou com “adição” de farinha integral.
Diante da ausência de critérios da legislação em relação a produtos integrais e com a falta de uma definição sobre o que é farinha refinada e a integral, o autor argumentou que isso dá margem a muitas interpretações. Diabéticos podem ser prejudicados, por exemplo, quando consomem o chamado “pão integral”, acreditando que podem controlar sua glicemia, mas ali pode existir somente farinha refinada, que se converte em glicose no organismo.
Segundo o projeto, o alimento pode ser considerado integral mesmo depois de beneficiado para o consumo, se mantiver suas características e nutrientes essenciais.
Os percentuais a serem seguidos são:
- Pães Integrais – pelo menos 51% de grãos integrais ou farinha integral
- Pães semi-integrais – entre 15% a 51% de farinha integral
Abaixo de 15% de farinha integral, o pão não poderá ser rotulado como integral.
Com essa nova definição nos rótulos, o consumidor poderá comprar seu alimento de forma mais adequada. A partir da entrada em vigor da lei, o descumprimento da medida por parte dos fabricantes será punido como infração ao Código de Defesa do Consumidor e à legislação sanitária.
A exata definição do que é um alimento integral, segundo os nutricionistas, é importante para que se possa controlar a insulina. No caso de pães e massas, o alimento integral faz com que sua absorção seja mais lenta no organismo, impedindo uma liberação rápida de glicose. Além disso, os alimentos integrais contém vários nutrientes, como vitaminas e minerais, que são eliminados no processamento de alimentos refinados.
A realidade por trás do rótulo
São raras as avaliações oficiais sobre as fórmulas dos produtos integrais. A Universidade Federal de Santa Catarina, em associação com a Faculdade de Ciências da Alimentação da Universidade de Manitoba, no Canadá, publicaram estudo demonstrando que os pães de centeio integrais, vendidos no Brasil, continham apenas 15,5% de ingredientes integrais, em média. O teor baixo desses componentes integrais mostrava a necessidade de regulamentação desses alimentos. O trabalho concluiu que haviam lacunas legais que comprometiam o efetivo benefício que pudesse haver no consumo dos alimentos integrais. Por isso, precisamos verificar as embalagens que detalham os ingredientes dos produtos. Os pães integrais, por exemplo, são fáceis de identificar, por serem mais duros, escuros e caros do que os comuns.
Atualmente os pães integrais já ocupam maior espaço nas prateleiras de supermercados do que o pão branco. Entretanto, as embalagens atuais que afirmam que o produto é integral ou fabricado com farinha integral, não são garantia de que a adição seja em quantidade suficiente para fazer diferença em relação à saúde.
Os órgãos de controle permitiram, até pouco tempo, que pães pudessem usar a marca de integrais mesmo com uma pequena quantidade de farinha integral. Apesar de isso não ser mais permitido, ainda existem rótulos enganosos. Nos EUA, por exemplo, é preciso que o produto contenha ao menos 51% de grãos integrais para poder usar o rótulo de integral.
Os pães que usam no rótulo a afirmação de serem “multigrãos”, “sete grãos”, “rico em fibras”, etc., confundem o consumidor, porque os grãos podem ser adicionados a um pão preparado com apenas farinha branca ou conter uma parcela mínima de farinha integral.
O que faz um alimento integral
Ainda não há clareza sobre o que faz um alimento ser considerado integral. Essa é uma questão que afeta diretamente milhões de pessoas. Nos supermercados encontramos barras de cereais com muito açúcar e sódio. Os sucos de caixa tem pouca ou nenhuma fruta. Chocolates são assim chamados com um conteúdo de menos de 25% de cacau em sua composição, o que realmente não o caracteriza como chocolate.
Em busca da padronização
A Anvisa fez reuniões com representantes de fabricantes de pães, massas e biscoitos, produtores de trigo e representantes dos ministérios da Agricultura, Saúde e órgãos de defesa do consumidor.
Um dos passos do trabalho foi averiguar como os padrões de classificação de massas integrais são adotados em outros países. O que se constata é que os parâmetros são diversos. Enquanto que no Canadá e na Holanda o percentual de farinha de trigo integral para pães deve ser de 50%, o mesmo valendo para massas, na Alemanha a exigência é de 90% para pães e 100% quanto a macarrão. O critério americano é de 8 gramas de grãos integrais por porção, sendo o mesmo adotado na Austrália e Reino Unido.
Estabelecer normas mínimas na fabricação dos alimentos integrais exige pesquisa e informação. A exigência da legislação deve funcionar para forçar as empresas a investir em alimentos integrais, com maior qualidade. Pesquisa realizada pelo Idec (Instituto de Defesa do Consumidor) constatou que, para 85,5% dos entrevistados, um produto só pode ser rotulado como integral se possuir, no mínimo, 50% de cereais integrais na sua fabricação.
Desafio do macarrão integral
A composição do macarrão com mais de 40% de farinha integral, torna o produto mais duro, pesado e pegajoso, reduzindo sua qualidade. A menor quantidade de farinha integral não significa, necessariamente, que os fabricantes estão economizando na adição da farinha integral, de acordo com representante da Associação Brasileira das Indústrias de Biscoitos, Massas Alimentícias e Pães & Bolos Industrializados.
Os produtores europeus, principalmente na Itália, desenvolveram o macarrão do tipo “grano duro”, feito com o trigo “durum” e com uma tecnologia que obtém a farinha integral com a moagem do grão do trigo inteiro. Essa é uma farinha mais pesada do que a farinha branca, mas que preserva os nutrientes e fibras, porque não passa pelo refinamento. A tecnologia utilizada permite que o macarrão fique menos pesado e perca o gosto que é característico do que é integral, portanto, mais agradável ao paladar. Já o macarrão produzido no Brasil utiliza o trigo do tipo “aestivum”, que é mais leve, porque o brasileiro prefere um ponto da massa que seja mais mole. Se for acrescentada uma maior quantidade de farinha integral, logicamente o macarrão será mais duro e a aceitação do público diminui.
Um outro obstáculo que existe no Brasil é o preço. O pacote de macarrão integral é mais caro. O consumidor que deseja a massa integral precisa ler a tabela nutricional no rótulo. A farinha integral deve ser o primeiro item da lista, porque os ingredientes em maior quantidade vêm primeiro.
Deixe um comentário